De Paulo Sandroni sobre “Desenvolvimento e Crise”

Editora Difel (Difusão Europeia do Livro), 1968

O prof. Paul Singer é antes de mais nada, um viciado em didática. Extremamente preocupado em se fazer entendido, procura desvendar para todos que o ouvem, leem ou “pressentem” os mistérios dessa dama a um só tempo triste e caprichosa que se chama Economia Política.

E, esta verdadeira mania, útil em qualquer circunstância, tem um significado todo especial principalmente no Brasil onde grande parte daqueles que se dedicam ao ensino da matéria e pesquisadores da mesma (os primeiros não se confundem necessariamente com os últimos) acabam, consciente ou inconscientemente mistificando os problemas, confundindo os homens de boa vontade, desviando a atenção dos incautos e distraídos para os aspectos menos essenciais da realidade, enfim criando uma autêntica patologia do acessório.

Estes falsos e confusos apóstolos só podem tornar a matéria “difícil”, quando a dificuldade reside muito mais no sujeito do que no objeto.

O pior é que a aparente dificuldade – assim como os tempos de guerra – permite abusos de toda ordem, principalmente no sediço terreno da sofisticação tanto vernacular como algébrica: são as palavras enfeitadas, cujo essencial reside em seu próprio vazio, (guardando pois certo parentesco com alguns personagens de nossa alta sociedade) e fórmulas matemáticas extremamente rebuscadas, que de tão acariciadas, às vezes se voltam e revoltam contra seu mal intencionado criador.

O resultado disso é bem conhecido: estes instrumentos, ao invés de se transformarem em agentes do progresso, se afeiçoam mais à ordem, não desempenhando no fundo outra coisa que o papel mesquinho de trincheiras da apologia e escudos da justificação.

E o povo? Bem o povo neste caso tem muito do tradicional marido traído: é sempre o último a saber porque a manteiga está mais cara ou os canhões mais baratos.

Em suma, com guias espirituais deste quilate, o povo só pode repetir o monótono papel de vítima ignorante, que não teve a felicidade de penetrar nas panelinhas, onde ardem com excesso de tempero os segredos do capital.

Mas o livro do prof. Singer surge como força contrabalançadora a esta nefasta tendência. Acreditamos que através dele foi dado um importante passo no sentido de esclarecer o público em geral, e os economistas em particular, sobre problemas que envolvem o destino destes oito milhões e quinhentos mil quilômetros quadrados de terra, sofrimento e esperança.

No entanto, seria errôneo supor que a única diferença entre o presente livro e as concepções dos “economistas” resida apenas em questões de didática. Nada mais enganador: em Desenvolvimento e Crise forma e conteúdo disputam um páreo duro, e quem sai ganhando são os leitores.

Se a forma é clara e objetiva, o conteúdo é elaborado a partir de concepções que procuram explicar, ao invés de justificar uma realidade – como é comum ocorrer entre os “euconomistas”– no caso a brasileira, inserida como é do conhecimento geral, no sistema capitalista.

Neste sentido são de grande significado, as análises e discussões contidas no segundo e quarto capítulos intitulados respectivamente, “Conceituação de Desenvolvimento” e “Ciclos de Conjuntura em Economias Subdesenvolvidas”.

Além disso, o livro abre também perspectivas para novas ideias e interpretações, e o mais importante, proporciona um terreno fértil e seguro para a polêmica e a crítica, entendidas aqui como elementos indispensáveis para o progresso da ciência.

Desenvolvimento e Crise, enfim, já representa um ponto de referência, cuja visita é obrigatória tanto por parte daqueles que discordam das premissas sobre as quais a obra se acha sedimentada, como por aqueles que, concordando, pretendem ir avante no sentido da solução dos nossos problemas.

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