Resenha de Leandro Konder a “Dominação e Desigualdade”

Em 1973, no auge do proclamado “milagre brasileiro”, quando o crescimento do PNB ultrapassava a marca dos 9% ao ano, Paul Singer escreveu: “Há, no entanto, vários sinais de que o Milagre se aproxima do seu fim”. As ruidosas manifestações da euforia oficial abafavam a sua voz, impediam-no de ser mais amplamente ouvido. Entre os poucos que o escultaram, alguns tiveram a impressão de que se tratava de wishful thinking, fenômeno comum nos homens de esquerda. Quem o conhecia, porém, sabia que não estava diante de um palpite trêfego: Paul Singer estuda muito e observa a realidade com implacável lucidez e, quando fala, sabe o que diz. A evolução do governo Geisel mostrou que a previsão era correta.

Paul Singer nasceu na Áustria, veio para o Brasil com oito anos de idade, fugindo do nazismo. Sua vida tem sido difícil: um constante desafio à sua capacidade de compreender o que está por trás dos acontecimentos, no fundo das coisas. Ele aprendeu, na prática, a resistir à tentação das conclusões demasiado fáceis.

Nos anos setenta, não lhe pareceu suficiente constatar e denunciar os dolorosos efeitos da concentração do capital e da renda: ele procurou compreendê-la em profundidade. Tratou de analisar a história do fenômeno, os modos da sua realização na expansão das relações capitalistas de produção. E foi desse esforço que nasceram os ensaios contidos (e encadeados) no presente volume.

Estudando a estrutura das classes sociais no Brasil, Paul Singer evita caracterizá-las exclusivamente em função dos níveis de renda (“ricos” e “pobres”), porém demonstra que o valor do nível de rendimento, como indicador, não pode ser subestimado. A importância dos níveis de renda se evidencia, por exemplo, na abordagem pelo autor da situação do pequeno burguês, que possui seus próprios meios de produção: a queda do seu nível de rendimentos pode forçá-lo a colocar-se como força de trabalho à disposição do capital, passando a integrar o proletariado; e a elevação do seu nível de rendimentos pode lhe permitir empregar assalariados que o substituam na produção direta, levando-o a ascend er &agra ve; burguesia.

As observações de Paul Singer sobre as modificações ocorridas nas classes e nos níveis de renda estão baseadas num cuidadoso exame dos censos de 1960 e 1970, bem como nos resultados das PNADs. Sem esquematismos, sem prejulgamentos, elas nos permitem compreender a congruência que existe, na recente evolução da sociedade brasileira, entre as estruturas de classe e a repartição da renda.

 

O livro Dominação e desigualdade foi relançado no 4o. volume da Coleção Paul Singer

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